Amar é um elo
Entre o azul e o amarelo.
Paulo Leminski
Por que somos quem somos?
Você já parou pra pensar como nos tornamos quem somos? Como nos constituímos “esse” ou “aquela”? Como nossa personalidade é formada?
Embora essas perguntas não sejam algo simples de responder, tendo em vista que cada sujeito é único, há um modo de nos “humanizarmos” e que torna possível a constituição de nosso ser.
Em primeiro lugar, é importante pensar que nossa personalidade é fruto de uma apropriação. Tornamos nosso algo que está no contexto em que nascemos e do qual retiramos as referências para a compreensão que fazemos do mundo e de nós mesmos. É deste ambiente que adquirimos os significados, a linguagem e nosso modo de pensar, tornando individual algo que é coletivo, compartilhado.
Esse cenário coletivo pode ser pensado enquanto um tecido composto pelas condições históricas e culturais de nossa época e dos lugares onde moramos. Além disso, há a rede socioemocional – nossa família, amigos, pessoas de convívio na escola, trabalho – em que estamos inseridos.
As Relações na Construção da Personalidade
Certa vez, uma conhecida contou o seguinte episódio: “quando eu era criança, tinha aproximadamente 8 anos, tínhamos, minha família e eu, muito medo de temporais. Sempre que chovia forte, quem estava em casa ia para debaixo da mesa, como uma forma de se proteger. Era assim que tentávamos lidar com o medo. Certa vez, quando eu estava na casa de uma amiga, começou um temporal. Imediatamente, fui para debaixo da mesa. Mas, para minha surpresa, ninguém mais fez isso! Foi somente então que percebi que aquele modo de encarar o temporal e de se proteger era algo que acontecia na minha família – e não em todas. E que talvez não fosse necessário ter tanto medo como eu tinha”.
Esse relato mostra que, pelas primeiras relações, nesse caso as familiares, essa pessoa aprendeu que as tempestades são algo ameaçador. Então, que é necessário buscar uma proteção, mesmo dentro de casa. Ela se apropriou dessa compreensão de modo a reproduzi-la, sem questioná-la, até o momento em que teve uma experiência com outras pessoas, que tinham um entendimento diferente sobre temporais e que os enfrentam de modo distinto. Seria isso suficiente para que alterasse sua vivência de medo ao acontecerem fortes chuvas? Não podemos ter certeza, pois o modo como ela se apropriará dessa nova experiência depende de vários fatores. Entre eles, idade, elaboração que ela puder fazer dessa vivência, ferramentas simbólicas que havia construído até então, e o modo como isso será vivido coletivamente entre os familiares, após compartilhar esse novo entendimento com eles.
A partir desse exemplo, podemos verificar que nossa personalidade vai sendo constituída em um contato ativo com os outros, com as condições materiais e simbólicas do tempo e espaço em que vivemos. Ou seja, nascemos e encontramos um mundo “dado” que está ao redor. Porém, vamos ativamente tornando particulares as experiências de estar nele, de conviver e de se relacionar com as pessoas e com os acontecimentos cotidianos.
Construindo nosso presente e nosso futuro
Em nossa trajetória, é imposto o fato de que o tempo passa e de que o presente é instante. Por isso, nossas ações traçam um caminho que nos leva a um futuro – inevitavelmente.
Nesse percurso, podemos encontrar situações que nos confirmam ou nos negam a possibilidade de construir e viver o futuro que desejamos. Podem ser pessoas, oportunidades, instrumentos, acontecimentos, que nos lançam e nos aproximam do que continuamente projetamos ser. Porém, muitas vezes, a realidade impõe barreiras ou impossibilidades. Então, nos vemos frente a vivências que nos impedem de alcançar aquilo que vínhamos buscando até ali.
É como nadar em meio a um redemoinho no mar. As forças das águas minam nossas energias, nos impedem de sair do lugar e alcançar a terra firme. Muitas vezes, conseguimos encontrar uma brecha em meio à correnteza. Pode ser também que o mar se acalme, se torne sereno e, então, possamos, ainda que cansados, encontrar um lugar seguro. Porém, em muitas situações, somente sairemos desse caos se encontrarmos alguém para nos socorrer.
Redes de Apoio
Assim, em momentos de dificuldades, pode ser que, na relação com aqueles com quem convivemos, vamos encontrar apoio e auxílio para enfrentar os impasses e ultrapassar os obstáculos que estão impedindo a realização de nossos projetos. Porém, isso somente ocorrerá se quem estiver no nosso entorno já tiver construído conosco laços. Experiências de troca, de compartilhamento de sentimentos, experiências, dores e alegrias. Se quem estiver ao nosso lado puder entender sobre o que falamos, sobre de que angústia sofremos, com o que e como nos emocionamos. Será importante, nesse processo, saber pedir apoio e ter construído com outros significados compartilhados, que possam também ser compreendidos por quem está à nossa volta.
Esse tecido, feitos de laços e de amarrações, não se constrói em um instante. Ele se tece na medida em que compartilhamos um caminho, em que vivemos e saboreamos o mundo em conjunto. São os momentos em que outros veem o que vemos, ouvem o que ouvimos. Ou, ainda, que se veem e ouvem outros tons, outros sons, aprendem a olhar de nossa perspectiva. Assim, ajudam a construir coletivamente sentido para aquilo que acontece.
Solidão
Muitas vezes, as experiências de sofrimento são envoltas de solidão. São aquelas vivências que não podem ser partilhadas e testemunhadas por outros. São aquelas que não produzem efeitos e não tocam a quem está ao nosso redor. Estar sozinho é adoecedor tendo em vista que nos reconhecemos nos outros e pelos outros. São as pessoas significativas para nós que nos dizem, de algum modo, por gestos, palavras, ações, que estamos no caminho para a realização de nosso desejo de ser! Ou são eles que, mesmo em silêncio, nos apontam que é preciso rever nosso projeto, mudar nossa direção, avaliar nossas escolhas.
Para que esses laços se construam, é preciso certo “esforço mútuo”. Será importante, nesse processo, saber pedir apoio. Da mesma forma, ter construído com outros significados compartilhados, que possam também ser compreendidos por quem está à nossa volta. A responsabilidade pela construção desse tecido é de todos que dele partilham.
Por isso mesmo falamos em redes: redes de apoio, redes socioemocionais, redes afetivas. É nelas que nos apoiamos quando o mar se torna revolto. É nelas que descansamos e usufruímos do sol quando o mar está calmo.
São os elos que nos mantém ligados à vida quando o caminho à frente parece tortuoso demais para ser percorrido. Quando a noite é longa, o vento é frio e o tempo, implacável. Quando aquilo que vivemos – e ainda vamos viver – parece ter perdido o sentido. Mas são também esses laços que ampliam nossas alegrias, nossos sorrisos, as gargalhadas, o brilho no olhar. São eles, então, que serão capazes de nos amparar nos tropeços, mas nos lançar para voos seguros.
Setembro Amarelo: elos ligando à vida
No mês de setembro, paramos para pensar na importância de valorizar a vida e de construir laços que nos mantenham amarrados a ela. É o mês em que fazemos um alerta para o fato de que muitas mortes poderiam ser evitadas, como as causadas por suicídio.
Ofereça apoio, se puder, e procure ajuda, se precisar.
A solidão é dura, angustiante. E, apesar das nossas diferentes histórias, certamente há ao seu redor pessoas dispostas a construir possibilidades para tornar a vida mais leve e o futuro, promissor.
Conte com nossa equipe para produzir elos entre você e o mundo e para produzir sentidos para o seu projeto.