Novembro é o mês da campanha Novembro Azul, destinado à conscientização sobre a saúde do homem e, em especial, à prevenção do câncer de próstata, o mais comum nesta população.
Culturalmente, há uma ideia de que os homens devem “ser fortes” e resolver os seus problemas sozinhos. Por isso, muitos deixam de buscar ajuda e negligenciam os cuidados com sua saúde. Ao mesmo tempo, quando enfrentam a doença, podem acabar evitando falar sobre como se sentem, isolando-se e sofrendo ainda mais com os estereótipos relacionados à masculinidade. Isso porque entendem que expor seus sentimentos poderia ser visto como sinal de fraqueza.
Porém, homens sofrem tanto quanto qualquer outra pessoa com câncer. Vamos, então, conhecer um pouco mais sobre os impactos emocionais dessa doença?
Leia a parte I do texto “Como a psicologia pode auxiliar pessoas com câncer?“!
Quais são as reações emocionais mais frequentes na pessoa com câncer?
Ao receber o diagnóstico, é comum que as pessoas tenham reações de choque, pelo impacto da notícia e pela associação frequente que socialmente ainda se faz do câncer com a morte. Essa associação foi construída porque, no passado, havia poucas possibilidades de tratamento para a pessoa com câncer e poucas chances de cura para a doença.
Porém, atualmente, em especial quando há o diagnóstico precoce da doença – e, por isso, a importância das campanhas de conscientização, da busca por avaliação médica caso haja algum sintoma e das rotinas frequentes de avaliação em saúde –, grande parte dos casos são curáveis ou podem ser controlados, o que diminui muito a chance de morte.
Passado o impacto do diagnóstico, é frequente que surjam sentimentos de raiva ou revolta (com perguntas, por exemplo, de porque a pessoa adoeceu), tristeza profunda, medos, ansiedades e angústias frente ao futuro. Esses questionamentos sobre o futuro são impactantes e podem colocar em suspenso muitos planos que a pessoa havia realizado até então. Podem surgir muitas dúvidas de se será possível realizar projetos e sonhos que ainda estariam por vir, e é importante que se considere a possibilidade de mantê-los, ainda que seja necessário adaptá-los. É fundamental lembrar que o futuro dá força ao nosso ser. Somos movidos pelos nossos desejos e é essencial, portanto, continuar desejando, ainda que, no presente, as rotinas estejam envolvidas com os tratamentos no combate ao câncer.
Ao longo do tratamento, inclusive, muitas perdas podem acontecer: afastamento do trabalho, mudanças nas relações, transformações do corpo devido à doença, mas também às terapêuticas (que podem gerar efeitos colaterais indesejados e incluir cirurgias), perdas financeiras e de pequenos prazeres ou rotinas anteriores. Essas vivências podem dar início a processos de luto, que são sentimentos que acontecem como uma reação a essas perdas, gerando sentimentos de desânimo, desesperança e melancolia.
Por outro lado, há casos em que a pessoa com câncer redescobre fontes de apoio e de suporte, pode se reconectar com aspectos importantes de sua vida, reorganiza seu cotidiano de modo a privilegiar a si mesma e aquilo que de fato considera primordial em suas existências.
Não é incomum ver pessoas dando novos significados às experiências de vida, às relações familiares e com amigos, redescobrindo-se queridas e amadas por eles. Além disso, algumas pessoas conectam-se com aspectos espirituais, conhecem outras histórias e trajetórias de pessoas que passam por situações semelhantes e encontram, no compartilhar com elas, fonte de esperança e força para enfrentar esse momento difícil de suas vidas.
E por que, então, buscar apoio da psicologia nesse período?
Se o câncer é uma doença complexa, também são complexas e variadas as reações a ela. Os tratamentos, da mesma forma, geram mudanças importantes na vida da pessoa com câncer. Todas essas alterações podem fazer com que o período do adoecimento e do tratamento seja atravessado por sentimentos contraditórios, sensações ambíguas e dúvidas. Inclusive, sobre “estar tendo a reação certa” a esses eventos.
Ao mesmo tempo, familiares e amigos próximos também são diretamente impactados pela doença e podem não se sentir aptos a oferecer escuta e apoio no enfrentamento dos sentimentos de quem adoece. Pode ser difícil para os envolvidos falar sobre a doença e sobre suas angústias. Pode ser que o paciente queira poupar a família de suas preocupações ou, até mesmo, mostrar-se “forte” o tempo todo – e a família pode fazer o mesmo.
E, neste caso, como funciona a psicoterapia na prática?
Assim, a psicoterapia pode ser um espaço em que a pessoa com câncer poderá falar abertamente sobre como se sente, sobre que emoções e pensamentos surgem ao longo do tratamento. Tudo isso sem julgamentos, mas também sem se preocupar com “possíveis impactos” de suas falas em quem ouve. Isso porque a psicoterapeuta estará preparada para ouvir e conduzir os diálogos, de modo a amparar o paciente e buscar estratégias de enfrentamento que façam sentido para ele.
Além disso, no espaço psicoterapêutico, espera-se que possa se discutir as experiências da pessoa como um todo. Isso porque é comum que as pessoas com câncer se sintam “reduzidas a ele”. Ou seja, é frequente que, ao enfrentar a doença, o dia a dia gire em torno do tratamento e todos ao redor da pessoa falem com ela somente sobre esse assunto. A psicoterapeuta irá, assim, respeitar o tempo e o interesse de cada um em relação ao conteúdo das sessões. Contudo, terá o cuidado de lembrar que a vida pode ser mais do que a doença e o tratamento, pois o paciente continua tendo outras relações, desejos, interesses e projetos.
Na psicoterapia, o paciente terá, portanto, amparo para observar, sentir e refletir como é a sua experiência, individual e única, de adoecer de câncer. Porque, embora a doença possa ser “a mesma”, o sofrimento é sempre particular. Nesse espaço, não se sentirá no dever de agir desta ou daquela maneira. Porém, terá legitimado seu modo de atravessar essa vivência, entendendo que para cada pessoa essa travessia é peculiar, não podendo, nem devendo, ser comparada a de nenhum outro sujeito.
O caminho da doença e do tratamento pode ser tortuoso. Mas pode ficar um pouco mais leve se a pessoa com câncer estiver amparada por profissionais capacitadas e puder usufruir de um espaço genuíno de cuidado e de encontro consigo mesma. Por isso, não deixe de procurar ajuda de profissionais capacitados e saber de que modo vocês podem construir, conjuntamente, ferramentas para passar por esse processo de modo mais fortalecido.